A literatura é
uma forma de representação da realidade (talvez essa seja uma das definições
mais simples). Tal representação acontece de vários modos, não se realiza,
portanto, de umaúnica maneira. Diferentes modalidades, formas poéticas,
linguagens,gênerossão usados ao gosto de cada autor. A literatura vive na sua
pluralidade (forma, conteúdo, estilo), por isso torna-se cada vez mais rica,
produtiva, viva.
Seguirum único modelo,
elegendo este ou aquelecomo a melhor expressão, seja em prosa ou em verso, é
umavisão preconceituosa e unilateral que não corresponde ao que a literatura se
dispõe a ser - um instrumento de possibilidades. Se a literatura busca na vida
(constituída pela diversidade)seu material poético, como falar dessa representação
da realidade seguindo apenas um padrão, julgado por alguns subjetivamente?
Pois bem, a
literatura de cordel é uma modalidade da literatura. Chama-se
cordel (como muitos devem saber disso) porque
em Portugal e Espanha os livretos, antigamente, eram expostos em barbante,
expressão que passou a ser usada no Brasil pelos estudiosos, a partir da década
de 1970, pois, anteriormente era chamada de literatura de folhetos. Produção
ibérica que chegou ao Brasil na bagagem do
colonizador eaqui se modificou devido aos fatores sociais, culturais e
étnicos do Nordeste brasileiro.
O
cordel é uma narrativa em verso, impressa e popular.Está centrada na temática
do cotidiano, adentrandoumespaço sociocultural, com seus conflitos e medos,
amores e desencantos.Esse olhar para o outro e para suas formas de vida, nos
interessa não somente pelo aspecto de denúncia desta ou daquela realidade, mas
tambémpela elaboração e procedimentos estilísticos adotados no cordel, pois, não
é feito de qualquer jeito, como muitos supõem; requer técnica, elaboração,
talento.Muitos estudiosos se debruçam sobre o cordel, analisando suas
implicações ideológicas e temáticas variadas.
A literatura alcança graus(de erudição) a partir das
raízes populares, sobretudo, da cultura nordestina.O erudito e o popular
transitam livremente pelo gosto do público e dos autores (Guimarães Rosa, José
Lins do Rego, Ariano Suassuna, Jorge Amado, entre outros), traduzindo ideias,
expressando emoções, demonstrando vivências, inspirando dizeres. Categorias que
se encontram num mesmo texto literário, sem rivalidades, convivendo com suas
diferenças. Universos que se entrecruzam, pois,estão na própria
feitura do texto de forma relacional.
A literatura
(seja qual for sua modalidade) intensifica as possibilidades que estão na vida
de cada um e se coloca como elemento de construção no confronto com a
alteridade. Ela é um arquivo de experimentação humana que apresenta o
convencional e o não convencional, contribuindo para a formação do leitor, que
precisa ser conhecedor das diferenças e ultrapassar as fronteiras.
Entendemos a
literatura como um campo aberto de diálogo capaz de nos oferecer um leque de
experiências humanas, de provocações, de confrontos, de buscas, de sonhos. O
cordel dá conta de tudo isso e tem um jeito muito próprio e espontâneo de dizer
sobre a vida, que enriquece a literatura com seus temas irônicos, imagens
chistosas e histórias cheias de ensinamentos.A
literatura de cordel constitui uma parte da herança cultural nacional ecompleta o grande painel que forma a nossa literatura
brasileira, portanto, um elemento de construção de identidade e diversidade
cultural. Com toda essa representação, o cordel não mereceria ser visto com
mais importância?
Socorro Pinheiro - Coordenadora do grupo de poesia
popular da FECLI/UECE.
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