Não satisfeita, Dilma conduzirá Armando Monteiro ao Ministério do Desenvolvimento. Monteiro é nome forte entre os sindicatos patronais: presidiu a Confederação Nacional da Indústria (CNI) e a Federação das Indústrias do Estado de Pernambuco (FIEPE). Durante sua campanha fracassada para o governo de Pernambuco em 2014, Monteiro reiteradamente lamentava a falta de uma “política industrial” consistente no estado.
Kátia Abreu, ex-PFL/DEM, pecuarista, líder da bancada ruralista no Senado, presidente da Confederação Nacional da Agricultura, é quem deve assumir o Ministério da Agricultura. Kátia Abreu fazia parte da oposição nominal ao governo do PT durante a administração de Lula. Durante o governo Dilma, gradualmente se aproximou do governo, inicialmente interessada em ditar os rumos da nova política portuária do governo — ou seja, subsidiar os portos para o escoamento da produção agrícola do agronegócio.
A indicação dos três para o governo Dilma mostra que a falta de escrúpulos do governo petista não é preocupante porque levará à implantação de alguma forma de socialismo burocrático, como temem críticos conservadores. Na verdade, a falta de escrúpulos do PT é problemática porque o partido já está perfeitamente alojado dentro da estrutura de poder do estado e não pretende quebrar o equilíbrio dessa estrutura. E, assim como o tzar e a aristocracia russa não permitiam a construção de novas ferrovias no império, preocupados que uma nova distribuição de poder econômico pudesse minar seu poder político, partidos tão incrustados dentro da máquina estatal quanto o PT não pretendem fazer mudanças radicais numa estrutura política que os beneficia.
Joaquim Levy, Armando Monteiro e Kátia Abreu se chocam frontalmente com a ideologia nominalmente defendida pelo Partido dos Trabalhadores — não só por sua militância, mais radical, mas também pelo núcleo petista. Representam bancos, a indústria e o agronegócio. Seus interessem particulares simbióticos aos do estado corporativo estão em clara oposição aos “trabalhadores” que o PT carrega em seu nome. Mas esses nomes não se chocam com o objetivo mais amplo de autopreservação do próprio poder através da manutenção da estrutura social vigente, da distribuição de poder econômico e a consequente perpetuação do poder político nos mesmos nódulos. Assim, a presença de lideranças setoriais no governo, como Armando Monteiro e Kátia Abreu, não são surpreendentes: são nada menos do que o esperado, dados os incentivos estruturais.
O estado, afinal, é um jogo de ricos. A retórica do punho em riste e os comerciais em vermelho na TV podem passar a impressão de que sua natureza muda: na verdade, é sempre a mesma. Se seremos bolivarianos, caudilhistas, varguistas ou peronistas, depende do marketing mais em voga no momento dentro da América Latina. Como Hugo Chávez e Nicolás Maduro são uma continuação do sistema oligárquico venezuelano, o PT de Lula e Dilma é uma continuação do sistema oligárquico brasileiro.
Karl Marx observou que o estado era apenas o balcão de negócios da burguesia e, nesse ponto, o petismo é a expressão máxima do marxismo: seus 12 anos de domínio da política nacional são caracterizados pelo relacionamento próximo com a política corporativa “burguesa”. O que, apesar das percepções generalizadas e da polarização cultural durante as eleições, não é uma ruptura; como afirmava Raymundo Faoro, no Brasil sempre vigorou um “capitalismo politicamente orientado”, direcionado e redirecionado de acordo com os desejos e as percepções do “estamento burocrático” que controla o estado.
Há um sentido, porém, em que o PT permanece distintamente leninista: sua cúpula ainda se julga uma vanguarda revolucionária e mistura o sucesso de seu partido com o sucesso nacional. Ainda existe um campo de força militante que defende o partido de críticas externas: as únicas críticas válidas ao PT são as feitas pela própria militância. Para a ideologia fundante do PT, como a de todos os partidos leninistas, estipula que se o PT vai bem, o país vai bem, e a revolução está em curso. Talvez seja verdade. Afinal, entre o capitalismo burocrático brasileiro e o centralismo burocrático soviético não há um abismo tão enorme. Erick Vasconcelos é jornalista e coordenador de mídias do Centro por uma Sociedade Sem Estado (c4ss.org). O Lenismo corporativo aqui.
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