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domingo, 16 de novembro de 2014

Banabuiú Seca afeta região do CE que antes era beneficiada por fartura de água

Produtores enfrentam quarto ano consecutivo de estiagem. Falta de chuva prejudica desenvolvimento das frutas do semiárido cearense. A seca, que está completando três anos em grande parte do Nordeste, começa a prejudicar uma área no Ceará que na última década impulsionou o crescimento de municípios e sustentou centenas de pequenos agricultores dos perímetros irrigados. A estiagem ameaça o trabalho em fazendas que se instalaram na região justamente por causa da fartura na oferta de água.

A fartura na oferta de água, o ingrediente mais valorizado dos últimos tempos, faz as lavouras crescem e as frutas se desenvolvem, principalmente no semiárido cearense. Em alguns pontos da região de pouca chuva e de terra castigada pela falta da água é possível ter plena produção graças a um sistema de irrigação desenvolvido para manter o abastecimento mesmo em época de estiagem.

O Ceará, terceiro maior exportador de frutas do Brasil, tem seis polos de produção irrigada. Com 12 bacias hidrográficas e 500 açudes, são 38 mil hectares de terras por onde passam canos e mangueiras. O sistema abrange 64 municípios.

Um do polos é o do Baixo Jaguaribe. De acordo com o Instituto de Pesquisa e Estratégia Econômica do Ceará (IPECE), a localidade tem o segundo maior PIB do estado, com R$ 7,7 mil per capita. O lugar só perde para a região metropolitana de Fortaleza.

Um dos municípios é Quixeré, com pouco mais de 19 mil habitantes. Sem perder o jeitinho de cidade pequena, a cidade viu o polo irrigado das frutas dar um bom impulso nos negócios, principalmente no comércio. Até o salão de beleza mais antigo, com 15 cabelereiros e manicures, comemora a chegada da concorrência.

O município vizinho é Russas, com 70 mil habitantes. Um dos empresários do lugar, que tem duas lojas de produtos para celulares, conseguiu este ano realizar o sonho de abrir um restaurante com serviço de entrega de quentinhas e self service com capacidade para servir 300 refeições por dia. O espaço tem ar condicionado, conforto muito apreciado pelos frequentadores.

A Universidade Federal do Ceará está construindo um campus em Russas. A cidade tem agora um hotel que, segundo o dono, mantém o padrão exigido por pessoas que viajam pelo mundo a negócios.

Os principais responsáveis pelo desenvolvimento desses municípios estão no campo, que sente primeiro o efeito da crise da água. Os pequenos produtores, que representam a metade dos associados dos projetos de irrigação, participam de uma licitação pública para adquirir pelo menos um lote de oito hectares. As frutas e o sistema que vão utilizar também variam. Um deles, por exemplo, é acerola orgânica.

O produtor Paulo Sérgio Lima começou a plantar acerola há três anos. Ele faz parte da infraestrutura de agricultura irrigada dos perímetros públicos do Ceará. Conselita, mulher do produtor, ajuda a embalar a acerola que tem selo de qualidade orgânica do IBD.
Antes de começar o cultivo, Lima trabalhava como técnico eletrônico na cidade. Assim como os outros irrigantes, o produtor paga R$ 180 por mês para a utilização da água e já faz experiências para economizar: O produtor intensificou o uso da cobertura morta, o que causou redução no consumo de água. “Reduzi a metade da água e com uma boa produtividade ainda”, diz.
A segunda maior produtora de melão do país está entre as grandes fazendas existentes nos polos irrigados. São propriedades totalmente privadas, mas que também participam da infraestrutura de irrigação.

Os proprietários da fazenda decidiram se instalar há 14 anos na região justamente por causa da água. A lavoura fica ao lado do Canal do Trabalhador, um longo canal com 102 quilômetros de extensão cujo projeto é administrado pelo governo estadual. A produção de melão ainda não foi afetada pela estiagem, mas um dos sócios explica que foi preciso mudar a perspectiva de crescimento por causa da seca.

“Esse ano nós praticamente não crescemos. O plano para o ano que vem também é não crescer. É manter só o que tem porque o que a gente está vendo de escassez de água. Nós conseguimos economizar em sistemas mais modernos de irrigação cerca de 30% da água que a gente vinha gastando há cinco, seis anos atrás. É mais ou menos assim: produzir melão com a menor quantidade de água possível”, diz o agricultor Silvio Dantas.

O que preocupa os produtores é que a região já entrou no quarto ano consecutivo de seca. Sem chuva, os açudes não conseguem fazer a recarga, que é o armazenamento de água para ser usada no período de estiagem. O açude Banabuiu, um dos açudes mais importantes do sistema de abastecimento dos projetos de irrigação, está com apenas 10,9% da capacidade total.

“Ele está perdendo uma média de seis centímetros de coluna de água por dia. Ele já perdeu este ano, com ganhos e perdas, perdeu 8,36 metros. Até primeiro de fevereiro de 2015 está garantido. Daí pra frente, só reza vai resolver o problema”, diz Audísio Girão, chefe da unidade de campo do DNOCS do Baixo Jaguaribe.

Os perímetros irrigados já estão sendo obrigados a fazer racionamento de água de irrigação. O gerente operacional do perímetro irrigado de Tabuleiros de Russas explica que algumas culturas poderão sofrer mais que outras. “Dentro do nosso planejamento, esse ano as culturas temporárias chegarão até novembro e dezembro e elas serão interrompidas”, diz Vandemberk de Oliveira.

Há cinco anos, Dulcileide Rodrigues e Raimundo de Souza largaram a cidade para investir em dois lotes do perímetro de Russas com 16 hectares de goiaba. A casa ainda não está acabada, mas aos poucos eles conseguiram montar a cozinha, a sala e no quarto do filho, que está na faculdade, tem internet e TV a cabo.

O casal gasta R$ 300 com a água. Pela primeira vez, eles estão tendo que diminuir a irrigação da lavoura. Dulcileide e Raimundo não falam em arrependimento de ter trocado a cidade pelo campo, mas estão assustados com a possibilidade de não poder ouvir o som da água todos os dias.

Todos na região aguardam ansiosos pela chegada da chuva para continuar vendendo bem no mercado, atraindo hóspedes no hotel, fregueses no restaurante e poder colher bons frutos no campo. Por Priscila Brandão Do Globo Rural via g1.globo.com

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